Aventuras de um Dissidente do PRP – Parte 2

Artigo publicado no Jornal “O Comércio do Porto” em 1982

“Nascido à 30 anos em Alqueidão da Serra, Porto de Mós, trabalhador numa pedreira até 20 de Julho de 1978 – data em que foi preso – o Franklin é neste momento, e apesar de ter colaborado com a polícia, o único dos ex-militantes do PRP que ainda não está em liberdade.

Militar da Companhia de Comandos 20/45, com uma comissão feita em Angola e Moçambique nos anos de 1973, 1974 e 1975, recheada de incidentes como a revolta branca em Lourenço Marques (Outubro de 1975), o Franklin, de regresso a Portugal tornou-se simpatizante das ideias de esquerda.

Uma pancadaria em que se envolveu com um “brutamontes” do Alqueidão, que se propunha a “rachar a meio todos os comunistas da terra”, culminou em 8 dias de cama para o “rachador”, 3 dias de baixa para o Franklin: – “Fiquei com as mãos de tal maneira inchadas que não podia trabalhar” – e num julgamento no tribunal de Porto de Mós.

“O julgamento no tribunal de Porto de Mós, no início do verão de 75, que já se adivinhava quente, sem eu perceber bem como, levou a que eu fosse considerado “o comunista numero um da zona”, posição extremamente ingrata para quem, como eu, vivia num meio pequeníssimo”.

Como foi cariz daqueles apaixonados tempos, o Franklin viu a sua integridade física alvo de ameaças, que o tornaram receptivo quando foi contactado por um funcionário do PRP da Marinha Grande para integrar aquela organização.

As ameaças obrigaram-me a procurar uma organização, pois estava a sentir-me desprotegido”. Explicou-nos o Franklin adiantando que os primeiros contactos com o PRP se realizaram em Outubro de 1975.

Do Grupo de Alqueidão, às Acções Ilegais

Franklin começou por fazer única e exclusivamente trabalho político, com um grupo de 15 trabalhadores que girava à sua volta em Alqueidão da Serra. Os contactos com as estruturas superiores do PRP era feito através de um funcionário da Marinha Grande.

“Fazíamos reuniões regulares para discussão política e organizávamos a agitação e propaganda do partido na zona: difusão do “Revolução” – o jornal do PRP – distribuição de comunicados, colagem de cartazes e pinturas nas paredes”.

Segundo o Franklin, não havia problemas com o pagamento das cotas e com a centralização do dinheiro das vendas do “Revolução”.

As cotas eram só para dar nas vistas aos mais novos, porque quando se precisava de dinheiro, ia-se aos bancos. O jornal era mais dado do que vendido e tenho a certeza que nem um tostão do dinheiro da sua venda chegava à sede a Lisboa”

Em Fevereiro de 76, confiaram à guarda do Franklin três espingardas automáticas G-3, vários carregadores de munições 7.62 e granadas de fabrico nacional.

“Era para quando se fizesse a insurreição armada nós, no Alqueidão, não ficássemos de mãos a abanar. Como a maioria do meu grupo não tinha feito a tropa eu ensinava-lhes a manejar e a montar e desmontar a G-3. Exercícios de fogo real nunca chegamos a fazer.”

A primeira vez que o Franklin foi solicitado para uma acção à margem da legalidade foi em Março de 76, e a missão era incendiar a sede do CDS em Leiria. Nesse próprio dia, um grupo de militantes do PRP que estava a colar cartazes em Leiria tinham sido espancados e corridos da cidade por pessoas afectas ao CDS, e por isso, a direcção regional da Marinha Grande do PRP decidiu destruir a sede daquele partido.

“Fomos quatro num Toyota até Leiria e atiramos garrafas com gasolina e granadas ofensivas contra a sede do CDS. Pretendia-se que a gasolina se espalhasse e depois fosse incendiada pelo rebentamento das granadas. A verdade é que, não sei porquê não pegou fogo, e os únicos prejuízos causados foram os vidros partidos pelo efeito de sopro das granadas ofensivas. A minha primeira acção clandestina tinha falhado”.

Plenário de Assaltantes num Pinhal da Quarteira

No Verão o Franklin foi contactado para o seu primeiro assalto a bancos por um militante da Marinha Grande que estava escalado para a acção, mas alegava não puder ir por ter problemas com a namorada.

O assalto seria no Algarve e integrado numa acção espectacular – roubo simultâneo a três bancos naquela província. O objectivo não era só o de trazer muito dinheiro, mas essencialmente fazer “uma acção espectacular”.

Contrariamente ao que se podia pensar, as acções não eram preparadas com um grande profissionalismo. Todos os 20 militantes que iam participar na acção se conheciam uns aos outros. Carlos Antunes e Isabel do Carmo estavam presentes e só nessa altura se iria decidir quais os bancos a serem assaltados.

“Com excepção do Carlos Antunes e da Isabel do Carmo, que estavam num apartamento, todos nós estávamos acampados ora num sítio ora noutro. Durante o dia estudávamos os bancos ou íamos até à praia. Para estudarmos os bancos, entravamos para trocar dinheiro, ou noutros casos, bastava uma vista de olhos de fora”.

Problemas surgidos com a ausência do numero de carros necessários para a execução da operação de “recuperação de fundos” – “éramos especialistas a assaltar bancos e não a roubar carros” – levaram à realização de um plenário dos 20 assaltantes, num pinhal da Quarteira, para decidir o que fazer.

Plano de Ocupação de Albufeira

Neste plenário, Carlos Antunes propôs como alternativa à acção inicialmente prevista (gorada pela falta de carros), uma ocupação de Albufeira, incluindo o assalto aos três bancos da vila e ao posto da GNR.

Felizmente que a maioria dos militantes convenceu o Carlos Antunes a desistir desta sua proposta porque era impossível conseguirmos sair todos do Algarve depois desta acção suicida”.

No plenário decidiu-se apenas pelo assalto a um banco, posteriormente realizado, e em que o Franklin não tomou parte, pois não eram necessários todos os 20 militantes para esta acção.

Também já não tinha dinheiro. Todas as refeições no Algarve tinham sido pagas do meu bolso. Estava a pagar para roubar. A acção além de não me dar lucro, dava-me prejuízo, pois enquanto estava no Algarve, não estava a trabalhar na pedreira no Alqueidão e o dinheiro não me caía do céu. Nesta altura comecei a colocar as minhas primeiras interrogações: Porque é que o Carlos Antunes e a Isabel do Carmo estavam num apartamento e nós acampados? Porque é que o Carlos Antunes fez questão de sublinhar, quando se discutia na reunião no pinhal de Quarteira a saída do Algarve após a ocupação de Albufeira, que ele partiria no dia anterior ao da acção, porque depois podia tornar-se perigoso?”

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Artigo publicado no Jornal “O Comércio do Porto” em 1982

Esta entrada foi publicada em Pós 25 de Abril. ligação permanente.

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