As Costureiras

Domingos Vieira Pedro e sua esposa Maria da Silva criaram os seus 7 filhos,  numa casa que tinha dois quartos, sala, cozinha com lareira e uma pequena dispensa, tal como a maioria das casas da aldeia na primeira metade do século XX.

Eram 6 raparigas: Mónica, Júlia, Olinda, Maria, Celeste e Fernanda, e 1 rapaz, o José.

Nesta terra de alcunhas, as raparigas eram conhecidas como “as Saloias”. O rapaz era o “Zé Mocho”.

A Júlia casou e foi viver para uma casa perto da casa dos pais. A Mónica também casou e emigrou para França.

Os outros não casaram e ficaram a viver numa casa baixinha mesmo em frente à casa dos pais. Viviam todos juntos na mesma casa mas cada um tinha a sua profissão.

A Maria costumava vender ovos e com o dinheiro que ganhava, ia a Porto de Mós à sexta-feira, e no mercado comprava tremoços para vender depois durante a semana. Para além disso ela tomava conta da horta e dos animais.

A Olinda era a cozinheira. Tratava de preparar as refeições para a malta toda.

Olinda da Silva

O José era Alfaiate. Aprendeu com o Albertino do Major, e trabalhava na Carreirancha. O Major tinha ensinado a profissão de Alfaiate aos seus filhos, e eles tinham um estabelecimento na Carreirancha, o Zé Mocho trabalhava lá com eles.

José da Silva (Zé Mocho)

A Celeste e a Fernanda eram costureiras e trabalhavam em conjunto. Eram “as Saloias”, costureiras conhecidas em toda a freguesia e arredores.

As Saloias eram procuradas por pessoas dos lugares vizinhos, que lhe chamavam as “costureiras sem medida”, porque, elas olhavam para o cliente e marcavam a data da prova, nem era preciso a fita métrica para lhe tirar as medidas.

Celeste Saloia (Celeste da Silva)

Havia pessoas que chamavam as Saloias para trabalhar em cada delas. As costureiras ficavam nessa casa a costurar durante uma semana inteira ou o tempo que fosse necessário, ou seja, trabalhavam ao domicilio.

As pessoas compravam os tecidos a metro, e quem sabia fazia a sua própria roupa, quem não sabia mandava fazer.  As lojas que vendiam tecidos a metro no Alqueidão eram:

  • O Zé Augusto que tinha uma mercearia no local onde mais tarde foi o Café do Farinhas
  • A ti Águeda do João Vitório que vendia os tecidos num pequeno espaço contíguo à  taberna do marido.
  • A ti Olivia que tinha uma mercearia e também vendia tecidos a metro
  • A ti Ilda, na Carreirancha que  também vendia mercearias e tecidos.

Os tecidos mais usados eram:

  • Chita – Tecido de algodão barato, estampado com cores fortes, geralmente flores.
  • Cotim – Tecido de algodão que era usado para fazer vestuário para homens.
  • Riscado– Tecido de algodão cru, riscado.
  • Sarja  – Tecido de lã, algodão ou mistos, com ligamentos sarja, com estrias na diagonal
  • Fazenda – Tecidos de lã
  • Flanela – Tecido macio, usado para vestuário, roupa para dormir, toalhas, etc
  • Tafetá – Tecido fino e acetinado feito de seda, lã ou sintéticos.
  • Seda  – Tecidos leves, brilhantes e macios. Eram usados em camisas, vestidos, blusas, gravatas, etc.
  • Terylene –  Tecidos de fibra sintética, muito leves.

As costureiras só faziam roupa de mulher e criança. Quem fazia roupa de homem eram os alfaiates.

A maioria das pessoas só tinha duas mudas de roupa,  uma para andar no dia-a-dia e outra para os domingos. As mulheres usavam vestidos e saias compridas porque não se podia mostrar os joelhos, e eram poucas as que usavam mangas curtas ou blusas sem mangas. As meninas normalmente usavam vestidinhos de chita e os meninos calções de cotim e camisas de riscado.

As Saloias também faziam os vestidos da Primeira Comunhão e Batizados, e na altura dessas festas elas trabalhavam de dia e de noite, à luz das velas e do  candeeiro a petróleo. Usavam o ferro a brasas para bater as costuras e para passar a ferro as peças de roupa que faziam.

Embora não fizessem vestidos de noivas, as Saloias faziam os fatos de saia e casaco que as noivas usavam no 2º  dia de casamento (roupinha de mulher casada).

Também foram as Saloias que fizeram os trajes das primeiras marchas do Alqueidão nas Festas de São Pedro em Porto de Mós, em 1985.

Em 1985, desce nas ruas de Porto de Mós, a primeira marcha, a segunda é 1988, outras nos anos de 1989, 1990, 1991, 1993. A realização da marcha teve sempre ao encargo da Casa do Povo

O trabalho das costureiras aumentava consideravelmente por alturas da Festa de Nossa Senhora, e pela Páscoa, porque nestas festas toda a gente gostava de estrear uma roupinha nova.

Celeste costureira

Nunca se deitava fora uma peça de roupa. Quando se rompia, remendava-se. Quando já não servia ao filho mais velho, ficava para o mais novo, ou para o primo, ou para o vizinho. Quando a roupa já estava tão velha que ninguém podia usar, cortava-se às tiras que depois eram tecidas de forma a fazer tapetes. Quando não servia para tiras então ia para fazer panos de chão, que eram muito precisos para espalhar a cera e puxar o lustro ao soalho.

Para além das Saloias existiam outras costureiras no Alqueidão:

  1. A Nilza, que era irmã da Maria Correia e vivia numa casa em frente ao Lagar;
  2. A Ti São Batata;
  3. A Ti Alcina;
  4. A Natércia;
  5. e também a São Lisboa e a Tina antes de emigrarem.

Já não há costureiras como antigamente, agora compra-se tudo feito, mas houve um tempo em que elas eram indispensáveis na vida da comunidade, e por isso permanecem para sempre na nossa memória coletiva.

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3 respostas a As Costureiras

  1. Jorge diz:

    Uma vida simples reciclar nao e nada novo os antepasados ja o faziam

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  2. Antonio Da Rosa Menezes diz:

    A minha avó era a Ageda Carvalho ( Ageda Cunena) e era a tramuçeira quando eu era garoto, vivia do outro lado da estrada sempre me lembro das saloias fazerem a roupa para as senhoras. Minha mãe era a Florinda. Obrigado pelas memorias.

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  3. António Saragoça (Tojeiro) diz:

    Creio que a loja do Zé Augusto que acima se refere, era, originalmente da tia Suzana e Chico Patrão. O Zé Augusto tomou posse quando o casal Zusana e Patrão imigraram . Foram nossos hóspedes aqui no Canadá fim dos anos sessenta.
    Obrigado pela hisória das “Saloias ” O marido da Julia , O Toino Fanheta era meu padrinho do batismo, ( ia la sempre pelo ” pão por Deus ” pois fazia deliciosas merendeiras ) enquanto o pai delas , o Ti Domingos era irmão do meu avô ,João vieira Pedro ,dito “João Gancho”.

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